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Dez Peças de Eurípides


Seguem anotações sobre outras dez peças de Eurípides:

Alceste

Personagens Principais Alceste – esposa de Ádmeto Ádmeto – rei da Tressália Morte (em grego Thânatos) – representada por um homem vestido de preto Héracles – herói grego

Interpretação O final feliz e toques de comicidade fazem de Alceste mais um drama satírico que uma tragédia. Destacam-se o egoísmo comicamente exagerado de Ádmeto e Feres, e o comportamento desenfreado de Héracles como elementos típicos do drama satírico.

A personagem Ádmeto é pobremente construída: rapidamente aceita o sacrifício de Alceste para depois agonizar-se de remorso.

Eurípides parece querer demonstrar que o Destino não é tão determinante assim. Afinal, ele escapa da morte e recupera a esposa que se sacrificara por ele. Seria mais um sintoma da decadência teológica ateniense.

Nota

  • Encenada pela primeira vez em 438 a.C., Alceste é a peça mais antiga conservada de Eurípides. A narrativa desenvolve-se em Feras, na Tressália.


 

As Fenícias

Personagens Principais Jocasta – mãe e esposa de Édipo Édipo – antigo rei de Tebas, já cego e velho Preceptor, Antígona, Polinices e Etéocles – filhos de Jocasta e Édipo

Interpretação O enredo remete a Sete Contra Tebas de Ésquilo, mas Eurípides inclui na narrativa Jocasta, ainda viva, e Édipo, já velho, partindo para o exílio com Antígona.

A adição de mais personagens e ações, algumas consideradas espúrias, nada acrescenta ao simbolismo do Ciclo Tebano.

Notas

  • As Fenícias foi provavelmente produzida em 406 a.C., e tem Tebas como cenário. Virgens fenícias, viajantes em direção a Delfos, formam o coro.

  • Acredita-se que há muitas interpolações espúrias no texto original de As Fenícias.


 

Electra

Personagens Principais Electra – filha de Clitemnestra e Agamêmnon Orestes – irmão de Electra Um cidadão miceniense – a quem entregaram Electra como esposa Clitemnestra – mãe de Electra, Orestes e Crisôtemis, viúva de Agamêmnon

Interpretação A Electra de Eurípides é uma jovem mimada e autoindulgente, cuja vida não seria tão ruim como ela tenta demonstrar. Egisto e Clitemnestra são apresentados favoravelmente, enquanto Orestes e Electra parecem traiçoeiros e enganadores – e imediatamente arrependidos depois de consumada a morte de Clitemnestra.

A visão particular de Eurípides desmonta o significado do mito, i.e. a supremacia de Urano sobre Gaia na batalha travada no interior da alma humana.

 

Hécuba

Personagens Principais Hécuba – viúva de Príamo, rei de Troia Polidoro – fantasma, filho de Hécuba e Príamo Polixena – filha de Hécuba e Príamo Agamêmnon – comandante supremo dos gregos na guerra de Toria

Interpretação Podemos entender esta tragédia no contexto histórico vivido em Atenas em plena guerra do Peloponeso (431-404 a.C.). Com a devastação provocada por duas pragas (a primeira (430-429) levou o estadista Péricles e a segunda (427-426) devastou um terço da população), com Atenas abrigando refugiados das cidades aliadas e vendo Ática e cidades vizinhas (e.g. Plateia em 427) sendo invadidas, os atenienses sentiam o peso da guerra e o real risco de suas consequências.

Efeito deformador da dor excessiva sobre o carácter, e a espantosa e bestial degenerescência da nobre dama que tudo perdeu, podem ser entendidos como a realidade (refugiados) e riscos aos quais os atenienses estavam sendo expostos.

Notas

  • A ação se passa em Quersoneso Trácio, onde as naus gregas estavam retidas por falta de ventos favoráveis. A peça estreou provavelmente em 424 a.C..

  • Em As Troianas, Polixena é sacrificada ainda em Troia.

  • Diferentemente de em As Troianas, temos aqui uma Hécuba ainda capaz de agir.

 

Helena

Personagens Principais Helena – filha de Zeus, esposa de Menelau Menelau – rei e Esparta Teónoe – profetisa, irmã de Teoclímeno Teoclímeno – rei do Egito

Interpretação Eurípides trabalha sobre a história de Helena, apresentando uma versão que a favorece. Um olhar benevolente a esta fantasia poderia apontar um libelo contra a guerra de Troia (como paralelo a guerra do Peloponeso) ao definir como um fantasma aquilo pelo qual gregos e troianos lutaram por uma década.

Notas

  • A versão de que Helena nunca chegou a Troia aparece inicialmente em Estesícoro (640-556 a.C.) no poema Palinódia, e depois em Heródoto.

  • A personagem feminina grega prisioneira num distante país bárbaro que é resgatada por um herói grego também foi o tema de Ifigênia em Táuris. O final feliz pouco lembra uma tragédia.

  • A inventividade sobre os temas míticos apresentada por Eurípides, particularmente nos seus últimos anos, parecem apontar a uma exaustão provocada pela repetição ao longo dos anos e por diferentes poetas sobre as mesmas lendas.

  • Entre os temas abordados na peça elencam-se ainda os deveres e direitos da hospitalidade, o amor e fidelidade conjugal, e o cumprimento das promessas que são transmitidas entre gerações.

 

Héracles

Personagens Principais Anfitrião – padastro de Héracles (filho de Zeus) Mégara – esposa de Héracles Héracles – herói grego

Interpretação Héracles é apresentado como bom e gentil, não havendo referência a sua perversão dionisíaca ou sugestão da razão de Hera enviar Loucura para provocar a atrocidade perpetrada pelo herói.

Amplia-se assim a abertura para as personagens questionarem os deuses: Anfitrião considera Zeus injusto diante da ameaça aos filhos de Héracles, e este questiona os deuses por suas atribulações.

Tudo o sentido simbólico do mito de Héracles desvanece nesta peça.

Notas

  • Esta tragédia foi encenada entre 418-416 a.C..

  • Eurípides encena o assassinato dos filhos e esposa de Héracles depois dos 12 trabalhos e não antes como a maioria dos relatos.

 

Ifigênia em Áulis

Personagens Principais Ifigênia – filha mais velha de Agamêmnon e Clitemnestra Agamêmnon – rei de Argos e Micena, comandante da expedição a Troia Clitemnestra – esposa de Agamêmnon

Interpretação Eurípides volta à Casa de Atreu e sua maldição. Agamêmnon aparece como um pai diante de um dilema agonizante. A humanização das personagens inclui as súbitas mudanças de posição de Agamêmnon e Menelau sobre o sacrifício de Ifigênia.

Várias variantes ao mito são incluídas: (1) Agamêmnon teria forçado Clitemnestra em casamento após assassinar seu marido e filho, (2) Clitemnestra prevê sua transformação enquanto espera o retorno de Agamêmnon, e (3) após implorar por sua vida Ifigênia aceita o sacrifício pare evitar que Aquiles combata outros gregos (demonstrando os atributos masculinos de coragem, honra e auto sacrifício) mas é substituída por uma corça pelas mãos de Ártemis que leva Ifigênia.

Estas inovações podem ter sido produzidas para adequar-se ao estado de espírito do público ateniense decorrentes da derrota na guerra do Peloponeso e da decadência da cidade já sob uma tirania.

Notas

  • Ifigênia em Áulis foi encenada após a morte de Eurípides na trilogia que também continha As Bacantes.

  • Reza o mito que o sacrifício de Ifigênia é uma exigência de Ártemis para compensar a corça morta pelos soldados gregos ali estacionados e liberar os ventos para que a frota siga para Troia.

  • O resgate de Ifigênia por Ártemis é considerada por muitos como uma adição ao texto posterior a morte de Eurípides.

 

O Ciclope

Personagens Principais Pilifeno – ciclope, filho de Posídon e da ninfa Toosa Ulisses – herói grego Sileno – nome genérico de velhos sátiros (ligado a Dioniso)

Interpretação Este drama satírico toma por base o mito narrado no canto IX da Odisseia (aventuras de Ulisses na caverna do ciclope Polifemo). Porém reduz o tempo de cativeiro de Ulisses de dois para um dia, e inclui as figuras de Sileno e dos Sátiros.

Nada de relevante é acrescentado ao simbolismo da jornadainiciática de Odisseu.

Notas

  • É característica do drama satírico (peça apresentada após a trilogia trágica) a exaltação da faceta animalesca da natureza humana e o divertimento do egoísmo audacioso.

  • Estima-se 424 a.C. como ano de estreia de O Ciclope. A ação se passa na Sicília, junto ao Etna (inovação de Eurípides). A peça é extremamente curta, pouco mais de 700 linhas.

  • O Ciclope é o único unanimemente reconhecido drama satírico que chegou até nós.

 

Os Heráclidas

Personagens Principais Heráclidas – descendentes de Héracles Macária – filha de Héracles e Dejanira Iolau – sobrinho de Héracles e, na velhice, defensor dos seus filhos Demofonte – rei de Atenas

Interpretação Mais uma peça de Eurípides mostrando a hospitalidade e atitude nobre de Atenas diante dos suplicantes. Um trabalho eminentemente patriótico. E neste caso o autor escolheu como suplicantes ancestrais dos espartanos contra os quais os atenienses se debatiam na guerra do Peloponeso.

Sem valores simbólicos, Os Heráclidas é considerada uma das peças menos populares de Eurípides.

Nota


  • Estima-se que a peça tenha sido encenada pela primeira vez entre 430 e 429 a.C..


 

Reso

Personagens Principais Odisseu – herói grego Diomedes – herói grego Reso – rei Trácio que vem auxiliar Troia

Interpretação Um assalto noturno para eliminar um inimigo é tema mais para um poema épico do que uma tragédia, pois falha em excitar algum interesse moral. O valor cênico de Reso está mais no vigor e velocidade da ação que nas palavras.


Simbolicamente Reso apenas ajuda na construção da astúcia da personagem Odisseu cujo mito se explica interinamente na Odisseia. Notas

  • Há muitas duvidas quanto a autoria do Reso que chegou até os nossos dias. Caso seja de Eurípides seria um de seus primeiros trabalhos.

  • A mesma ação da peça é descrita no livro X da Ilíada.


 

Notas

  • Eurípides (484 a.C. – 406 a.C.) nasceu em Salaminas (ilha próxima de Atenas).

  • Escreveu 74 peças (67 tragédias e 7 dramas satíricos). Algumas fontes atribuem-lhe 92 peças. Dessas chegaram até nossos dias um drama satírico (O Ciclope) e 18 tragédias: As Bacantes (provavelmente 405 a.C.), Medéia (431), Hipólito (428), As Troianas (415), Helena (412), Orestes (408), Ifigênia em Áulis (405), Andrômaca, Os Heráclidas, Hébuca, As Suplicantes, Electra (415-413), Héracles, Ifigênia em Táuris, Íon, As Fenícias, Alceste e Reso (de autoria contestada).

  • Eurípides apresenta o homem revoltado com sua condição, cuja alma sucumbe diante da realidade O homem como ele é, segundo Aristóteles, em oposição a como deveria ser apregoado por Sófocles. Vai-se do destino implacável esquiliano para a rebelião metafísica humana de Eurípides, passando pela esperança de Sófocles. Com Eurípides a tragédia mítica convertesse numa representação da vida cotidiana.

  • Eurípides está impregnado com as ideias e retórica dos sofistas.

  • Eurípides venceu apenas 4 vezes nos festivais a Dionísio (Ésquilo venceu 32 vezes e Sófocles mais de 20 vezes).

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