top of page

Clint Eastwood (1930- )

  • Foto do escritor: Cultura Animi
    Cultura Animi
  • 11 de out.
  • 6 min de leitura
ree

Directing is about knowing what you want and getting it done as simply as possible.”– Clint Eastwood


A obra de Clint Eastwood incorpora uma rara combinação de inteligência moral, habilidade cinematográfica e contenção emocional. Ao longo de mais de cinco décadas atrás das câmeras, ele desenvolveu uma voz artística única – estoica, humanista e patriótica – que fala tanto através de dramas íntimos de personagens quanto de filmes históricos de grande escala.


Os seus melhores filmes têm uma riqueza, não apenas estilística – onde ele revela ter apreendido a preocupação de Sergio Leone com a iluminação e composição, e a precisão de enquadramento, edição e narração de Don Siegel – mas também uma complexidade moral que extrapola a imagem de Eastwood criada por suas personagens como ator.


Usando uma equipe enxuta de colaboradores de confiança, mantendo as despesas dentro, quando não abaixo, do orçamento, e filmando com velocidade lendária, Eastwood foi um produtor modelo, o que lhe trouxe um elevado grau de autonomia em seus projetos.


Poucos diretores sustentaram um trabalho tão longevo e qualitativamente consistente em tantos gêneros com westerns, dramas de guerra, biopics e estudos de personagens. Apesar da variedade, seus filmes compartilham uma sensibilidade moral e emocional unificada – reflexivo, enxuto e contundente sem estardalhaço.


Seguem comentários sobre alguns de seus trabalhos mais significativos:


High Plains Drifter (1973): Pistoleiro sem nome (interpretado por Clint Eastwood) chega em uma pequena cidade e é contratado pelos locais para protegê-los de bandidos que rumam naquela direção, mas ele tem uma agenda pessoal. Um western sombrio e perturbador, uma fábula fantasmagórica numa atmosfera de pesadelo, com a justiça em um mundo corrompido sendo possível apenas mediante a violência – apartando-se da nitidez moral dos filmes de John Wayne. O comportamento da população da cidade guarda semelhança com o clássico High Noon (1952) de Fred Zinnemann, e o pistoleiro sem nome seria o fantasma do xerife de High Noon caso ele tivesse sido assassinado.


The Outlaw Josey Wales (1976): Josey Wales (interpretado por Clint Eastwood) busca vingança após o assassinato de sua esposa e filho. Baseado no romance The Rebel Outlaw Josey Wales de Forest Carter. Em sua quinta direção Eastwood começava a chamar atenção por suas qualidades como cineasta, particularmente na condução dos atores. Ao longo do filme a clássica narrativa de vingança transforma-se numa fábula de redenção, com a personagem central reencontrando sua humanidade ao ser caridoso com o crescente grupo de necessitados que encontrava em seu caminho, e ao encontrar uma nova companheira.


Pale Rider (1985): Um pregador misterioso (interpretado por Clint Eastwood) protege uma comunidade de mineiros de um grupo de vilões. O título refere-se ao cavaleiro do apocalipse representante da morte. A narrativa é uma revisão, redentora e humanizada, de High Plains Drifter, com o espectro vingador transformado no espectro da graça – o fantasma de Pale Rider ajuda os colonos em sua luta, aproximando-se do protagonista de Shane (1953). Um western meditativo sobra justiça, destino e mortalidade, com imagens que remetem ao lirismo de John Ford.


Unforgiven (1992): Pistoleiro aposentado (interpretado por Clint Eastwood) relutantemente assume uma empreitada para vingar uma injustiça. Sucesso de bilheteria e vencedor de cinco Oscar, incluindo os de melhor filme e de melhor diretor. Eastwood retornava às raízes morais e temáticas do western, mas adicionando uma dose de cinismo, ironia e trivialidade. Um mundo onde a violência gera violência, e em que ela (a violência) efetivamente resolve problemas, embora trazendo um custo também para seus sobreviventes. A vingança e a honra são apresentadas como questões complexas, e a reputação, uma mercadoria frequentemente criada e abusada, leva a pressões indesejadas e obrigações a se conformar com as expectativas dos outros. Eastwood dirige o filme com um estilo silencioso, usando longas tomadas, cores suaves e vastas paisagens vazias que refletem uma desolação moral. O ritmo é lento, permitindo que a tensão e a emoção construam naturalmente até a erupção final da violência.


The Bridges of Madison County (1995): O fotógrafo Robert Kincaid (interpretado por Clint Eastwood) entra da vida da dona de casa Francesca Johnson (interpretada por Meryl Streep) por quatro dias na década de 1960. Baseado no best-seller homônimo de Robert James Waller (1939-2017). Grande filme sobre a necessidade de sobrepor o dever sobre o desejo – Robert e Francesca encontraram a promessa da felicidade perfeita, mas entenderam que as coisas mais importantes da vida nem sempre são sobre a busca da felicidade pessoal. A direção de Eastwood é marcada por um tom calmo e paciente – ele permite que as emoções surjam naturalmente, sem manipulação ou sentimentalidade.


Mystic River (2003): O trágico assassinato de uma menina de 19 anos reúne três amigos de infância que ainda moram em Boston: o gângster pai da vítima, um detetive e um homem perturbado de quem ambos suspeitam. Excelente adaptação do romance homônimo de Dennis Lehane – uma tragédia disfarçada de drama criminal. Mystic River oferece uma meditação ambígua e instigante sobre se a esperança de redenção é inútil. Filmes assim fornecem narrativas que nos levam a fazer perguntas filosóficas perenes, enriquecem nossa humanidade, não fornecendo respostas claras, mas apontando além de si mesmos para nossa necessidade de sabedoria.


Million Dollar Baby (2004): Velho treinador de box (interpretado por Clint Eastwood) relutantemente concorda em treinar uma aspirante (interpretada por Hilary Swank). Baseado em três contos de Jerry Boyd (vulgo F.X. Toole): The Monkey Look, Million $$$ Baby, e Frozen Water. Um filme sincero e deprimente sobre personagens fracassadas e desesperadas em busca da salvação um no outro – o tipo de fábula que atrai a audiência para vidas com as quais ela atenta. Infelizmente o treinador e sua pupila não encontram a própria humanidade que buscavam, e a cena final dele num obscuro dinner é a perfeita representação do inferno. O filme merecidamente arrebatou quatro Oscar, incluindo os de melhor filme e melhor diretor.


Flags of Our Fathers & Letters from Iwo Jima (2006): As histórias de vida dos seis homens que levantaram a bandeira na batalha de Iwo Jima, seguido da mesma batalha narrada do ponto de vista dos japoneses. Um díptico moral apresentando os dois lados de uma mesma desdita. Uma das representações de guerra mais ambiciosas, humanísticas e moralmente complexas já feitas, provocando uma reflexão sobre a verdade, a memória e a humanidade partilhada. Notar a cinematografia de palette dessaturado de Tom Stern: um mundo despido de glória, dominado por lama, fumaça e cinzas.


Gran Torino (2008): Depois que um adolescente hmong tenta roubar seu Gran Torino de 1972, um amargurado e preconceituoso veterano da Guerra da Coréia busca redimir o menino e a si mesmo. A personagem central Walt Kowalski, o velho reacionário interpretado pelo diretor, é a culminação do tough guy representado por Eastwood como cowboy ou policial: o herói disposto a sacrificar sua vida pelo que é certo. Kowalski é o "man without a name" e o Dirty Harry aposentados, em seus últimos anos de vida – grande modelo de conduta masculina. Uma parábola de redenção e alcance da Graça que ainda aborda temas como a solidão no envelhecimento, e a necessidade de propósito após uma grande perda. Imperdível.



American Sniper (2014): Chris Kyle, sniper SEAL da Marinha, salva inúmeras vidas no campo de batalha e transforma-se em uma lenda. Baseado no best-seller e controverso livro de memórias de Kyle. Edificante homenagem a um herói real. Uma lição de masculinidade e dever. O diretor habilmente demonstra o pedágio mental e físico do heroísmo de uma maneira pungente. Não é um filme para pussies. Bom trabalho do ator Brad Cooper representando o protagonista.


Sully (2016): Baseado na verídica investigação das ações do capitão Chesley 'Sully' Sullenberger (interpretado por Tom Hanks) que fez um pouso de emergência no rio Hudson, em Nova York (voo 1549 da US Airways). O filme enfatiza que o governo pode estar errado, os computadores podem estar errados, os engenheiros podem estar errados e que, em última análise, o homem na linha da frente é quem tem que agir. Numa era de cinismo, Sully celebra um herói definido não pela fama ou rebelião, mas pela humildade, senso de responsabilidade e firmeza moral. Eastwood faz um drama sobre a decência, e torna a integridade cinematográfica.



©2019 by Cultura Animi

    bottom of page