Seguem curtas anotações sobre alguns filmes lançados nos anos 1900-1940 (notas dos filmes entre parênteses – escala de 1 a 5):
The Fountainhead (1949): Um arquitecto intransigente e visionário luta para manter a sua integridade e individualismo, apesar das pressões pessoais, profissionais e económicas para se conformar aos padrões populares. Propaganda da ideologia de Ayn Rand. A posição de Rand não busca o equilíbrio da natural tensão entre indivíduo e coletivo. Arquiteto (interpretado por Gary Cooper) quer implementar estilo próprio em seus edifícios, sem entender que a cidade também tem que ter um estilo e se cada um faz o que quer acaba como a horrenda São Paulo. Dirigido por King Vidor. (2)
Call Northside 777 (1948): Repórter de Chicago reabre um caso de assassinato ocorrido há uma década. Baseado em história verídica de como um jornalista (interpretado por James Steward) e seu editor provaram a inocência de dois acusados de matar um policial. Honesta e engenhoso, o filme foi filmado, em sua maior parte, nos cenários de Chicago onde os eventos reais ocorreram. Uma recordação de que já houve jornalismo investigativo que buscava a verdade. (3)
Born to Kill (1947): Divorciada calculista arrisca suas chances de riqueza e segurança com um homem que ela não ama ao se envolver com um psicopata impetuoso. Baseado no romance Deadlier Than the Male (1942) de James Gunn. Dirigido por Robert Wise, Born to Kill é um dos filmes noir mais amargos, com quase todas personagens detestáveis. Difícil de assistir, mas, ainda assim, eficaz e atraente. (4)
Miracle at 34th Street (1947): Um clássico de Natal. Depois que uma mãe divorciada de Nova York contrata um velho simpático para fazer o papel de Papai Noel na Macy's, ela fica surpresa com a afirmação dele de ser o bom velhinho em pessoa. Quando sua sanidade é questionada, um advogado o defende no tribunal, argumentando que ele não está enganado. O filme enfatiza a importância da família e que bens intangíveis como amor, esperança e confiança são mais importantes do que dinheiro. Engraçado e cativante, também aborda o crescente consumismo no pós-guerra. (5)
A Song to Remember (1945): História de Chopin com foco no romance do compositor com a escritora George Sand. Exageradamente romanceado, mas com duas cenas marcantes: o primeiro encontro de Chopin com Franz Liszt, e George Sand levando um candelabro pelo salão escuro e colocando-o sobre o piano para revelar Chopin como o pianista, em vez de Franz Liszt. (2)
Detour (1945): VA vida de um pianista de uma boate nova-iorquina, se transforma em um pesadelo quando ele decide pegar carona até Los Angeles para visitar a namorada. Você pensa que este é o sujeito mais azarado do mundo até escutar a última frase explicando o sentido de destino. (3)
Arsenic and Old Lace (1944): Escritor de livros sobre a futilidade do casamento (interpretado por Cary Grant) arrisca sua reputação depois de decidir se casar. As coisas ficam complicadas quando ele descobre que suas queridas tias solteiras são serial killers. Clássico exemplo de farsa onde tudo é um meio-tom acima – exagero de gestos, vozes, expressões e situações acentuam o surreal, o passional, o absurdo. Um filme de Frank Capra que envelheceu mal. (2)
Gaslight (1944): Clássico thriller de George Cukor. Marido (interpretado por Charles Boyer) tenta enlouquecer a esposa (interpretada por Ingrid Bergman) enquanto procura por joias escondidas. Muitos anos após o lançamento do filme, seu título popularizou-se em um termo (gaslight ou gaslighting) para designar uma forma de abuso psicológico em que informações são manipuladas até que a vítima não consiga mais acreditar na própria percepção da realidade. (3)
The Hunchback of Notre Dame (1939): Na França do século XV, uma jovem cigana é acusada de assassinato pelo apaixonado Chefe de Justiça, e apenas o sineiro deformado da Catedral de Notre Dame pode salvá-la. O filme dá ênfase naquilo que a obra de Victor Hugo tem de pior, i.e. um extravagante panfleto revolucionário. Vale apenas pela atuação paradigmática de Charles Laughton e para testemunhar a primeira produção americana de Maureen O’Hara. (2)
Lost Horizont (1937): Frank Capra traz para a tela o bestseller de James Hilton publicado em 1933 sobre a utopia do paraíso terrestre. Lost Horizon é uma história de lugar e tempo que, para desgosto dos personagens principais, os prende à realidade que já conhecem ou os entrega a um mundo encantador, pronto para a autorreflexão. Para marcar o limiar entre o deserto onde nada pode viver e a utopia onde a vida pode ser vivida como deveria ser vivida, Capra coloca um simples poste de madeira. O poste é uma metáfora para a adoção da autorreflexão existencial que pode levar ao autoconhecimento, uma seta que aponta para a possibilidade de cultivar reverência e admiração, e a hierarquia de estar aprisionado dentro das contingências do aqui e agora. (3)
The Crime of Monsieur Lange (1936): O chefe de uma editora é um mulherengo e um idiota, mas o que aconteceria se ele desaparecesse repentinamente? Panfletária contribuição do diretor Jean Renoir à Frente Popular da França na qual militava. Não há disfarces: um empresário inescrupuloso versus os operários santificados que formam uma cooperativa. Sobram farpas também para o Catolicismo... pacote militante completo. Salva-se apenas alguns belos trabalhos de câmera, e os olhos da atriz Nadia Sibirskaïa. (2)
Triumph of the Will (1935): Filme de propaganda do comício do Partido Nazista em 1934 em Nuremberg, Alemanha. Lendário documentário nazista realizado por Leni Riefenstahl. Uma aula de direção de propagada política e registro de eventos públicos. Valor histórico. (3)
Shanghai Express (1932): Mulher famosa viaja de trem em uma situação perigosa com um capitão britânico que ela amava. A mensagem é interessante: amor sem fé não tem valor. Dirigido por Josef von Sternberg, este filme tem estilo – uma fusão de pecado, glamour, descaramento, arte e senso de humor. Mas peca no abuso do clichê da prostituta (interpretada por Marlene Dietrich) com coração de ouro. (3)
Cabiria (1914): A personagem Cabiria é uma criança romana quando a sua casa é destruída durante a erupção de um vulcão. Vendida em Cartago para ser sacrificada em um templo, ela é salva por Fúlvio, um espião romano. Mas o perigo espreita e o ódio entre Roma e Cartago só pode levar à guerra. Primeiro grande épico do cinema em inovadora superprodução (e.g. primeiro uso de câmara móvel). Valor histórico – apenas para aficionados. (3)