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Akira Kurosawa (1910-1998)

"Movie directors, or should I say people who create things, are very greedy and they can never be satisfied... That's why they can keep on working. I've been able to work for so long because I think next time, I'll make something good." – Akira Kurosawa

"The term 'giant' is used too often to describe artists. But in the case of Akira Kurosawa, we have one of the rare instances where the term fits. – Martin Scorsese


As encenações de ação e padrões de edição de Kurosawa entraram no léxico do cinema, influenciado cineastas ao redor do mundo. Como Bergman, Bresson, Fellini e Antonioni, Kurosawa é um gênero em si mesmo, não é igual a nada senão a si próprio.


A universalidade de sua obra explica facilmente seu sucesso mundo afora. Os temas abordados em seus filmes tocam na essência humana, não sendo indiferentes a ninguém. Talvez por isso mesmo Kurosawa foi buscar inspiração em autores universalistas como Shakespeare e Dostoiévski.


Kurosawa rivaliza com Shakespeare precisamente porque tem uma visão artística independente, embora sobreposta. O cenário cultural japonês – com sua realeza, pompa e feroz lealdade familiar – impactou positivamente os filmes shakespearianos de Kurosawa. Ele também possuía uma combinação impressionante e incomum de sensibilidade de artista (ele começou como pintor e tinha um olho notável para luz, cor e clima) e um senso de dramaturgo para as grandes questões (ele considera Dostoiévski entre suas influências mais significativas). Elementos distintamente japoneses retirados do teatro medieval Noh e do budismo, também dão forma aos seus filmes.


Tal como as peças de Shakespeare, os filmes de Kurosawa espelham a natureza, especialmente o coração humano, e muitas vezes discernem nela uma estranha perturbação. Mas nem o poeta nem o cineasta sucumbem ao niilismo ou adotam a conclusão de que a vida humana não tem sentido. Em vez disso, colocaram dramaticamente diante dos nossos olhos as questões inevitáveis ​​e perenes sobre a trágica frustração das nobres aspirações humanas. Também levantam questões sobre a bondade, o mal, a traição humana, a justiça e a misericórdia de Deus, sobre o aparente silêncio de Deus e sobre o mistério de como os seres humanos podem tornar-se tão distorcidos e depravados, tão cegamente inclinados contra o Bem.


Os seguintes títulos são um oásis no presente deserto cinematográfico:


Quiet Duel (1949): Um cirurgião contrai sífilis de um paciente durante uma operação. A vida do médico é destruída, mas ao contrário do paciente, ele não destrói outras pessoas junto com ele.A diferença entre o homem consciente que vence seus instintos e o sub-humano que sucumbe a eles. A alma comanda a mente e ambas comandam o corpo, a quebra desta hierarquia é a ruína humana. Também lembra-nos de nossa condição trágica, onde podemos sofrer horrivelmente mesmo que nada tenhamos feito para merecer tal flagelo.

Stray Dog (1949): Durante um verão sufocante, detetive de homicídios novato tenta rastrear sua pistola roubada. Um recorte do Japão pós-guerra. “A má sorte faz o homem ou o destrói. Você vai deixar isso te destruir? Dependendo de como você encara, a má sorte pode ser uma grande chance.” – Inspetor Nakajima.


Rashomon (1950): O estupro de uma noiva e o assassinato de seu marido samurai são relembrados a partir das perspectivas de um bandido, da noiva, do fantasma do samurai e de um lenhador. Primeiro filme japonês a fazer sucesso internacionalmente. Até que ponto mentimos para nós mesmos para preservar nossa autoimagem?


The Idiot (1951): Veterano japonês, parcialmente enlouquecido pela guerra, viaja para a ilha nevada de Hokkaido, onde entra em um triângulo amoroso com seu melhor amigo e uma mulher desgraçada. Kurosawa transporta o romance de Dostoiévski para o Japão.


Ikiru (1952): Burocrata tenta encontrar sentido para sua vida depois de descobrir que tem câncer terminal. O homem comum diante da perspectiva da morte. Um monumento a altura de A Morte de Ivan Ilitch de Tolstói.


Seven Samurai (1954): Agricultores de uma aldeia explorada por bandidos contratam um samurai veterano para proteção, e este reúne outros seis para se juntarem a ele. Os samurais de Kurosawa poderiam ser cowboys de John Ford e vice-versa. A nobreza da espada, a conquista da honra e o dever de proteger os mais fracos. No final temos o contraste da nobreza da casta guerreira (xátrias) diante do egoísmo comezinho da quarta casta (sudras) – vivemos tempos sombrios quando xátrias adotam os valores dos sudras.


Throne of Blood (1957): General endurecido pela guerra, instigado por sua ambiciosa esposa, trabalha para cumprir uma profecia de que ele se tornaria senhor do Castelo Teia de Aranha. Inspirado em Macbeth de Shakespeare. Na versão de Kurosawa, o retorno do guerreiro é prolongado, pois ele se perde na floresta que circunda o castelo, floresta que ele conhece bem, mas que agora se tornou um labirinto para ele – as imagens aqui destacam a sensação estranha e perturbadora de estar perdido em uma região antes familiar, agora desconhecida. O filme termina não como em Shakespeare – com a restauração da ordem natural e política – mas com um castelo vazio, o “castelo das ilusões”. A “bruxa” solitária na versão de Kurosawa, o fantasma de uma mulher sentada diante de uma roda de fiar, é uma espécie de filósofa da desgraça. Ela proclama que “a vida dos homens não tem sentido”, como a dos insetos, cujo destino é tornar-se o “fedor de carne podre”. “Os homens são estranhos”, ela continua, “com muito medo de olhar para o fundo de seus próprios corações”.


The Hidden Fortress (1958): Atraídos pelo ouro, dois camponeses gananciosos escoltam, sem saber, uma princesa e seu general através das linhas inimigas. Fonte para o roteiro de Star Wars de George Lukas.


Yojimbo (1961): Ronin astuto chega a uma cidade dividida por duas gangues criminosas e decide jogá-las uma contra a outra para libertar a cidade.Sergio Leone inspirou-se aqui para fazer o famoso A Firstfull of Dollars com Clint Eastwood. Samurais e cowboys se entrelaçam uma vez mais.


Sanjuro (1962): O ronin de Yojimbo está de voltam desta vez para ajudar um jovem e seus companheiros a salvar seu tio, que foi incriminado e preso por um superintendente corrupto. Inesquecível ver o rude e mortal Sanjuro acabrunhado diante da senhora e sua filha: a essência feminina que aplaca a natural violência masculina.


High and low (1963): Executivo de uma empresa de calçados de Yokohama é vítima de extorsão quando o filho de seu motorista é sequestrado por engano. Embate entre o bem e o mal.


Red beard (1965): No Japão do século XIX, um médico de temperamento rude, mas caridoso, treina um jovem estagiário. O homem que se considera falho está a um passo da virtude, enquanto o orgulhoso só se salvará através da humildade. Filme obrigatório nesta época em que a classe médica entram em conluio com políticos para enganar o povo.


Dersu Uzala (1975): Exército russo envia explorador em uma expedição ao deserto nevado da Sibéria, onde ele faz amizade com um experiente caçador local. Filmado na União Soviética, Kurosawa teve muitos problemas para executar seu projeto. Durante as filmagens encontrou o diretor russo Andrei Tarkovsky que fez o seguinte registro em seu diário (Time Within Time: The Diaries 1970-1986): “I saw Kurosawa at the studio, we had dinner together. He is in an appalling position: they won't give him any Kodak film, and keep assuring him that Soviet film is wonderful. They have wished Tolya Kuznetsov onto him. His team is frightful, informers and cretins. He must somehow be warned that everybody is lying to him.” (30-12-1973, Moscou). Mesmo assim Kurosawa entregou aqui um belo encontro entre duas almas a despeito de todas as diferenças culturais, e uma reverência ao conhecimento indutivo. Nenhum outro filme exprime tão bem o ensinamento bíblico sobre a amizade: "O amigo fiel é uma forte proteção: e quem o achou, achou um tesouro." (Ec 6-14). E, de facto, o valor da verdadeira amizade é, sem dúvida, imensurável, pois envolve a companhia eterna de uma pessoa, com quem se pode partilhar tanto as alegrias desta vida como as tristezas. Na verdade, esta é a tese do filme, já que o afeto mútuo que o capitão russo e Dersu Uzala professam um pelo outro transcende todos os tempos e lugares.


Kagemusha (1980): Ladrão assemelhado a um senhor da guerra samurai é contratado como sósia do senhor. Mais tarde, quando o senhor da guerra morre, o ladrão é forçado a pegar em armas em seu lugar. A força da propaganda política. O quanto somos movidos por reais valores? Fundamental para idiotas úteis que andaram postando e-mojis de arco-íris, seringa e bandeira da Ucrânia nas redes sociais.


Ran (1985): No Japão Medieval, senhor da guerra idoso se aposenta, entregando seu império aos seus três filhos. No entanto, ele subestima enormemente como o poder recém-descoberto irá corrompê-los. Inspirado em Rei Lear de Shakespeare.

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