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Robert Siodmak (1900-1973)



O alemão Robert Siodmark imigrou para os EUA no início da II GG, sendo rapidamente reconhecido como um mestre no emprego de iluminação e outros efeitos atmosféricos em thrillers psicológicos. Ele será sempre lembrado como um dos principais diretores a criar o estilo visual do filme noir nos primeiros anos do ciclo clássico do gênero. O catálogo de seus filmes do final da década de 1940 inclui muitos dos noirs mais impressionantes e influentes produzidos naquela época.


Diretor inovador, ele explorou os impulsos criminosos ou psicóticos de seus personagens através da ambientação do mise-en-scène. O controle de todas as ferramentas cinematográficas sob seu comando – ângulo de câmera, iluminação, composição, movimento e design – foi usado para estabelecer efetivamente um mundo de destino, paixão, obsessão e compulsão.


A obra de Siodmark compreende 62 realizações, mas pouco se destaca fora daquele rico período na segunda metade da década de 1940. Seguem comentários de seus filmes mais distintos:


People on Sunday (1930): Dois homens e duas mulheres desfrutam de um agradável domingo num parque berlinense em meio à labuta interminável da semana de trabalho. Primeiro trabalho do diretor com colaboração de outros jovens cineastas como Edgar G. Ulmer (25 anos), Billy Wilder (23 anos) e Fred Zinnemann (22 anos). Improvisado, com atores amadores e de baixíssimo custo, o filme atraiu críticos ao longo dos anos como sendo um presságio do Neorrealismo italiano e da Nouvelle Vague francesa. Direto e despretensioso, retratando sem verniz a vida cotidiana de jovens urbanos (reflexo da vida da audiência), o filme contrastava com os temas e produções da época. A calma, pureza e inocência da narrativa também contrapõem-se com o momento histórico que se desenvolvia fora da tela. Vale assistir pela relevância novadora e pela oportunidade de visualizar algo da vida na República de Weimar.


Phantom Lady (1944): Secretária (interpretada pela bela Ella Raines) arrisca a vida tentando encontrar uma misteriosa mulher que pode provar que seu chefe não assassinou a esposa. Adaptado do romance homônimo de Cornell Woolrich, Phantom Lady foi um dos filmes seminais do ciclo noir clássico. Foi também o primeiro filme noir americano dirigido por Siodmak, no qual ele ajuda a dar vida ao estilo visual do gênero através da mise-en-scène. Diferentemente da maioria das obras do gênero, aqui temos uma heroína no comando das ações e a narrativa se desenvolve num ambiente mais glamoroso. O filme alavancou a carreira de Siodmak, dando início a sua série de bons filmes noir.


The Suspect (1944): Homem casado e infeliz (interpretado por Charles Laughton) começa um flerte com uma mulher mais jovem (interpretada por Ella Raines). Quando sua esposa ameaça arruiná-la, ele decide agir. Melodrama vitoriano magistral que gera simpatia pelo criminoso em função da mendacidade de suas vítimas, mas a justiça prevalece.


The Spiral Staircase (1945): Em 1916, um serial killer ataca mulheres deficientes; numa noite, durante uma tempestade, a muda Helen é visada pelo assassino. Thriller gótico misterioso, forte em atmosfera e suspense.


The Dark Mirror (1946): Homem é encontrado assassinado e testemunhas têm certeza sobre a mulher que viram saindo de seu apartamento. Só que a mulher tem uma irmã gêmea (Olivia de Havilland nos dois papéis), e descobrir qual delas é a assassina parece impossível. Doppelgänger como a divisão clássica entre o bem e o mal – ambos habitam simultaneamente dentro de cada um de nós e o indivíduo é responsável por escolher o seu caminho.


The Killers (1946): Assassinos matam uma vítima que não resiste (interpretado por Burt Lancaster em seu debut nas telas), e o investigador de seguro Reardon descobre seu envolvimento passado com a bela e mortal Kitty Collins (interpretada por Ava Gardner) – baseado no conto homônimo de Ernest Hemingway. A estrutura do filme, um quebra-cabeça fragmentado de múltiplas narrações, deu ao filme a reputação de o Citizen Kane (1941) do noir. A personagem Kitty Collins de Ava Gardner é a femme fatale que sintetiza o perigo e mal do desejo como um dos principais temas do gênero noir. Também vale a pena ver a versão homônima dirigida por Don Siegel em 1964.


Cry of the City (1948): Tenente da Polícia, amigo de longa data da família Rome, enfrenta o assassino de policial Martin Rome. Retrata o fato de que condição econômica não determina a moral de ninguém, e até o criminoso ri de sua própria tentativa de justificar seus atos em função de uma infância pobre. Destaque para a preocupação do policial (interpretado por Victor Mature) em salvar a alma do irmão de Martin Rome tanto quanto em prender este último.


Criss Cross (1949): Motorista de caminhão blindado (interpretado por Burt Lancaster) e sua ex-mulher (interpretada por Yvonne De Carlo) conspiram com uma gangue para que seu próprio caminhão seja roubado. Baseado no romance de Don Tracy. Como em The Killers, a personagem de Burt Lancaster é incapaz de resistir à atração de uma mulher fatal, demonstrando, em ambos filmes, lassidão e perda de energia e propósito moral. O alto-contraste da iluminação e os ângulos dramáticos da câmera transmitem uma sensação de aprisionamento e dor psíquica. Notar o debut cinematográfico de Tony Curtis dançando com Yvonne De Carlo.


The File on Thelma Jordon (1949): O promotor-assistente Cleve Marshall se apaixona pela misteriosa Thelma Jordon (interpretada por Barbara Stanwyck) quando ela busca ajuda para resolver roubos na propriedade de sua tia. Um homem fraco, sentindo pena de si mesmo, é vítima fácil de qualquer um – que o diga o mundo pós-moderno com suas hordas de vitimizados manipulados pelo establishment. Oportunidade de ver a grande femme fatale de Double Idemnity (1944) num filme de Siodmak.


The Devil Strikes at Night (1957): De volta a Alemanha desde o começo dos anos 1950, Siodmak realiza este thriller baseado em uma série de artigos do jornalista Stefan Amberg (sob o pseudônimo Will Berthold), publicados na revista Münchner Illustrierte em 1956 sobre um assassino serial na Alemanha hitlerista ao final da II GG. Hitler negando a possibilidade de existir um ariano tão decadente lembra o governo soviético em uma situação bastante similar retratada no filme Citizen X (1995) de Chris Geroldo – nazismo e socialismo, dois lados da mesma moeda. O filme é mais interessante pelas ideias e ironias que sugere do que por si só. Como thriller não atinge uma unidade satisfatória, mas provoca reflexões sobre as personagens e os possíveis cursos de ação. Assim como em M (1931) de Fritz Lang o assassino é débil mental, uma confusão entre patologia mental e anímica na vã tentativa de mitigar a culpabilidade dos monstros viciosos.

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