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O Pato Selvagem de Henrik Ibsen



Personagens Principais Gregers Werle – jovem que retorna a casa depois cuidar de interesses da família por 17 anos Hjalmar Ekdal – fotógrafo, amigo de infância de Gregers

Personagens Secundárias Haakon Werle – industrial, pai de Greger Velho Ekdal – antigo sócio de Haakon Werle (atualmente subalterno a este), pai de Hjalmar Gina Ekdal – esposa de Hjalmar, antiga empregada na casa de Haakon Werle Hedvig – filha de Hjalmar e Gina, 13 anos Senhora Soerby – governanta da casa de Haakon Werle Dr. Relling – médico, inquilino na casa de Hjalmar Molvik – antigo estudante de teologia, preceptor, inquilino na casa de Hjalmar

Interpretação A peça discute a questão da verdade em decisões morais. Gregers não tem dúvidas de que deve dizer a verdade independentemente da situação real e emocional envolvida. Dr. Relling define-o bem ao dizer-lhe: “...E o seu caso é muito complicado. Em primeiro lugar, sofre desta virulenta febre moralista.” – a doença de Gregers é a febre da justiça aguda. E como um soberbo militante da verdade, Gregers vai produzir o maior desastre.


O pato selvagem é a verdade submersa, escondida, que Gregers, como um cão de caça quer trazer à luz. Mas ele não tem todas as informações, e em nenhum momento mede as consequências que seu ato pode provocar. Diabolicamente ele envenena a mente de Hjalmar, e, apesar do primeiro impacto destrutivo, influencia negativamente uma criança (Hedvig), levando-a a morte.


Haakon Werle errou no passado, mas procura remediar a situação e produz um ato bom, viabilizando a família Ekdal. Mas este fato não importa para o militante da verdade. Gregers não entende que nossa obrigação moral não é fiscalizar a verdade dos outros, mas é viver a nossa sua vida com verdade. Aquele que procura desmantelar as mentiras alheias, e produzir a verdade nos outros é um extraordinário narcisista, tão profundo e sofisticado que apenas para fazer o proselitismo da sua atividade existencial acaba provocado destruição e morte.


Na verdade Gregers é o pato selvagem, pois ele não consegue enxergar suas motivações íntimas – relações mal resolvidas com os pais – por trás de suas ações. Gregers projeta seus problemas no mundo e outorga-se o direito de consertá-lo, seja como for. Mas a vida humana é de uma precariedade e imperfeição absoluta. Vivemos uma existência imperfeita. Todo o indivíduo que quer produzir uma realidade perfeita transforma-se num Gregers, transforma-se num monstro.


Gregers é muito parecido com o Dr. Stockmann de O Inimigo do Povo, representando a origem da mente revolucionária. O Dr. Stockmann também não admite ser contrariado ou estar errado, porque se acredita a personalização da moralidade. E assim como Etzel Andregast de O Processo Maurizius de Jakob Wassermann, a ilegitimidade das intenções por trás da ação de Gregers traz apenas problema a todos os envolvidos.


 


Notas

  • Henrik Ibsen (1828-1906) é considerado por Otto Maria Carpeaux como o maior dramaturgo do século XIX.

  • Norueguês, Ibsen faz parte de um pequeno grupo de grandes literatos escandinavos, incluindo August Strindberg e Knut Hamsu.

  • Entre as peças de Ibsen destacam-se: Quando nós, os mortos, despertamos (1889 – autobiográfico segundo Monir), Um Inimigo do Povo (1882), Peer Gynt (1867) e Casa de Bonecas (1879).

  • Pato Selvagem foi escrita em 1884 e é quase uma tragédia no sentido grego da palavra.

  • Ibsen saiu de moda com a banalização dos temas antes considerados polêmicos como feminismo (Casa de Bonecas), doenças venéreas (Espectros) ou revolução (Um Inimigo do Povo). Porém Ibsen considerava-se poeta e não crítico social. Sob a superfície narrativa Ibsen abordaria questões metafísicas.

  • O império da verdade apregoado por Gregers remete aos imperativos categóricos de Kant. Kant achava que os problemas morais não podiam ser resolvidos pela experiência humana, por ela ser muito enganadora, pois algumas sensações agradáveis são imorais e algumas sensações desagradáveis são morais. Logo, Kant achava que deveria haver uma mediação externa para o problema moral – mediação apriori, em termos kantianos, foco central de sua filosofia. Para Kant os assuntos morais são assuntos imperativos e cria duas categorias: (a) imperativo hipotético é uma ordem que você tem que atender, mas condicionada a outra coisa, e.g. se você quer emagrecer, não coma mais massa – não é uma ordem no sentido absoluto da palavra porque só serve para quem quer emagrecer; (b) imperativo categórico é uma ordem absoluta, e.g. seja honesto e não diga mentiras – essas não poderiam ser condicionadas de modo algum, não vale mentir nem mesmo para o ladrão quando ele quiser saber onde você guardou o dinheiro. Todos os dez mandamentos seriam imperativos categóricos, e.g. não matarás implica em não ir à guerra contra um inimigo invasor – obedecer a uma regra nesse grau de subserviência é uma monstruosidade.

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