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David Lean (1908-1991)


"My distinguishing talent is the ability to put people under the microscope, perhaps to go one or two layers farther down than some other directors." – David Lean


Um dos diretores ingleses mais destacados, David Lean foi antes de tudo um excelente artesão. Nos anos anteriores à guerra, ele desenvolveu a reputação de ser o melhor editor do país; seus filmes se distinguem pelo controle do ritmo e pelo exemplar uso do contraponto. Também é reconhecido por seu senso composicional perfeccionista, apesar de ter um olhar mais convencional que os grandes mestres – é na edição que se ele cria a tensão central em sua obra.


Notório perfeccionista, favoreceu assuntos históricos e literários de peso, mas na maturidade sucumbiu à grandiosidade visual. Seus primeiros filmes, mais modestos, combinam senso de design e a edição para criar entretenimentos nos quais as personagens ainda não são ofuscadas pelo ambiente. Já seus últimos filmes deixam a impressão que Lean se perdeu no sentido da sua própria grandeza pictórica – priorizou a forma em detrimento do conteúdo.


Seguem seus filmes mais insignes:


In Which We Serve (1942): Primeira direção de Lean (em conjunto com Nöel Coward). Realizado durante a guerra, o filme tem clara intenção de enaltecer a coragem e o sacrifício da marinha britânica, e faz isto com qualidade estética e a dose certa de emoção. Belo exemplo da antiga fleuma britânica.


Brief Encounter (1945): Talvez o filme caracteristicamente mais inglês já produzido. Inesquecível exemplo de como responsabilidades e obrigações devem se sobrepor aos desejos. As personagens Laura e Alex honram os valores mesmo à custa da dor – um triunfo para a sua humanidade. Muito claramente, o fim não justificava os meios – a vida não é simples e a grandeza do filme reside na sua consciência desta complexidade. Os olhos da atriz protagonista (Celia Johnson) são exibidos com uma imensidão não menos impressionante que o deserto de Lawrence ou a tundra de Jivago.


Great Expectations (1946): Uma das melhores adaptações dos romances de Charles Dickens, nenhum outro filme ou adaptação televisiva conseguiu alcançar algo parecido com a intensidade dramática e riqueza visual desta versão de Great Expectations. A excelente cinematografia cria uma atmosfera mais que apropriada, pena terem escalado o ator John Mills de 38 anos para representar Pip em seus 20 anos de idade. Também é de se lamentar a escolha pela versão final de reconciliação entre Pip e Estella. Alec Guiness, em seu primeiro papel importante, encarna a personagem Pocket.


Oliver Twist (1948): David Lean não resistiu voltar a Dickens depois do sucesso de Great Expectations. O filme ainda impressiona: magnífico em sua recreação de época, brilhantemente editado (com muita influência russa denotada), e filmado em sombras fuliginosas e luzes ameaçadoras. Lean captura a essência de Dickens revelando todos os horrores daquele tempo, mas também todas suas esperanças. Ótimas atuações de Alec Guinness, Robert Newton, Kay Walsh e John Howard Davies (todos em papéis coadjuvantes).


Summertime (1955): A câmera capturou tão bem Veneza que o número de turistas duplicou depois da estreia do filme. Mas não dá para imaginar o filme sem Katherine Hepburn que espetacularmente dá vida e sentimento a uma solteirona em meio ao conflito entre seus desejos e sua honra. É o filme preferido de David Lean,


The Bridge on the River Kwai (1957): Em seu primeiro épico David Lean não deixou de penetrar nas personagens e fez um filme sobre o orgulho (húbris), e de como ele envenena a alma. O coronel inglês, grande vilão interpretado por Alec Guinness, colocou sua autoestima, seu desejo de ser lembrado, acima de sua missão e das vidas de seus compatriotas que juros defender – um erro que vai reconhecer apenas em seu último suspiro. O contraste com o coronel japonês não poderia ser mais gritante, pois este foi capaz de engolir todo seu orgulho em prol de seu dever. A personagem de William Holden também contrapõe-se com o arrogante coronel inglês, pois, mesmo não querendo estar ali, se sacrifica por aquilo que era seu dever – ação que desperta o inglês de seu vaidoso delírio. É o melhor épico do diretor.


Lawrence of Arabia (1962) Normalmente em épicos a ação ganha prioridade em detrimento de personagem e enredo. Mas neste a personagem-título e as maquinações políticas ao redor de suas façanhas são o centro das atenções. Em meio a espetaculares cenas do deserto e de batalhas nunca perdemos o foco da procura de Lawrence por sua identidade – para nunca encontrá-la. Um filme para ser visto na tela grande do cinema.


Doctor Zhivago (1965): Baseado no livro homônimo que deu o Prêmio Nobel a Boris Pasternak. Fracasso de crítica e sucesso de público. Tem o mérito de mostrar o horror do comunismo (apesar do arco-íris sobre a represa ao final), mas precisa de paciência para aguentar o ridículo ator Omar Sharif ao longo das três horas de duração do filme.


A Passage to India (1984): Ultimo filme de David Lean, e mais um épico favorecendo a grandiosidade das imagens. O diretor foi fiel ao romance homônimo de E.M. Foster, e aí reside seu aspecto negativo: a apresentação caricata dos ingleses para criticar sua presença política na Índia, bem como a quase divinização dos indianos (que só não foi maior por pouco abordar os aspectos místicos contidos no livro). Há grandes atuações das atrizes Peggy Ashcroft e Judy Davis, mas também tem um Alec Guinness irreconhecível (uma caricatura de brâmane que caberia melhor numa comédia).

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