Personagens Principais Leontes – Rei da Sicília Hermíone – esposa de Leontes Políxenes – Rei da Boêmia Perdita – filha de Leontes e Hemíone Florizel – filho de Políxenes Camilo – nobre da Sicília que ajuda Políxenes
Personagens Secundárias Antígono – nobre da Sicília que leva Perdida até a Boêmia Paulina – esposa de Antígono Pastor – pai putativo de Perdita Bobo – filho do pastor Mamílio – filho de Leontes e Hermíone Autólico – um canalha
Interpretação A peça apresenta os elementos de drama (tragédia na nominata adotada para classificar as peças de Shakespeare) nos primeiros três atos onde o ciúme de Leontes (rompimento da Terra com o Céu) traz a desgraça para ele, sua família e seu reino. No quarto ato temos a narrativa típica da comédia: a vontade de união do casal enfrentando o antagonismo do pai e resultando em fuga. E, finalmente, no quinto e último ato a abordagem da hereditariedade do trono típica das peças históricas. Assim Shakespeare abrange aqui seus três gêneros típicos. O mesmo se dá nas peças Cimbelino, Péricles e A Tempestade. Por isso uns classificam-nas como tragicomédias, outros como the last plays, e Northrop Fry como romanescas.
A chave da peça parece estar na discussão entre Perdita e Políxenes sobre a flor goivo que a primeira despreza:
“Políxenes – Por que, gentil menina, as desprezais?
Perdita – Por ter sabido que nas suas cores, ao lado da criadora natureza a arte também influi.
Políxenes – Que seja assim; mas em nada melhora a natureza senão por meios que ela mesmo cria. Assim, essa arte a qual vos referistes, que ajuda a natureza, é uma arte feita por ela própria. Assim, gentil menina, enxertamos num galho em tudo rústico alguma planta rara, vindo a casca de baixa espécie alimentar o broto de uma raça mais nobre. Essa arte, certo, corrige a natureza... não, transforma-a; mas é uma arte que é a própria natureza.”
A relação entre natureza e arte retorna nos encômios de Florizel a Perdita: “Sempre ultrapassa o que fazeis a tudo quanto está feito. Se falais, querida, desejaria que falásseis sempre; quando cantais, quisera que, cantando, vendêsseis e comprásseis e, cantando, distribuísseis esmolas, murmurásseis vossas preces, bem como dirigísseis vossos negócios. Se dançais, acaso, desejara que fosses uma vaga, para que não fizésseis senão isso, em movimento sempre, sempre a mesma, sem mais função alguma. Vosso modo de proceder, tão singular em cada caso à parte, tal como o mais recente, coroa vossos feitos. Desse modo, vossas ações em tudo são Rainhas.” Florizel parece querer perpetuar a beleza de Perdita através da arte (poética). Quer capturar e preservar o melhor da natureza através do artifício humano.
A natureza (Behemoth) pode ser bela e boa (Perdita, as cenas pastorais na Boêmia) ou destrutiva e má (urso, tempestade). Também a criação humana (Leviathan) pode ser boa (as belezas da cultura nos reinos da Sicília e Boêmia) ou má (ciúmes de Leontes). Toda a construção humana, esboçada pelos dois nobres na abertura da peça, é precária. A civilização pode ser destruída pelo domínio da irracionalidade, aqui simbolizada pelo ciúme de Leontes e o rompimento do casamento entre o Céu e a Terra.
Como Políxenes explica a Perdita, a ação humana – artes poéticas (Belo), práticas (Bom) e teoréticas (Verdade) – deve ser exercida sobre a natureza para melhorar a condição humana neste mundo. Através da nossa razão também podemos controlar o lado obscuro da nossa natureza.
Camilo representa o mundo civilizado que ajuda a restabelecer a ordem através do uso das virtudes cardeais (Prudência (sabedoria), Temperança, Fortaleza (coragem) e Justiça).
Leontes purga seu erro com um genuíno arrependimento. E, finalmente, a estátua de Hermione combina a arte com a natureza. A equilibrada combinação de ambos restabelece a ordem, o Céu e a Terra se encontram novamente em harmonia.
Se na primeira parte da peça tivemos o Inferno, e no intervalo de dezesseis anos o Purgatório, assistimos ao Céu na última parte, com o homem (Florizel – Alma) encontrando aquilo que perdeu com a Queda, ou seja, seu estado primordial (Perdita – Espírito).
Notas
A fonte desta comédia foi o conto em prosa Padosto de Robert Greene publicado em 1588. Conto do Inverno teria sido escrito em 1611. Trata-se de uma obra da maturidade de Shakespeare (1564-1616).
O enredo se desenvolve em um mundo ficcional onde a Boêmia tem litoral e oráculos gregos coexistem com escultores renascentistas.
Além dos dezesseis anos, a morte de Antígono nas garras de um urso faz a ponte entre o drama e a comédia. O urso representa a aristocracia (ao passo que o javali remete ao sacerdotal). Também remeta a sacrifício, sagrado ou raivoso.
Mamílio começa a contar sua “história triste” ao ouvido de Hermíone no momento que as desgraças começam a tomar forma. Como se a etapa dramática de Conto do Inverno fosse uma ficção de Mamílio.
O anuncio da morte de Mamílio coincide com o desprezo de Leontes pelas palavras do oráculo.
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