A situação com um ente masculino (Ele) e outro feminino (Ela) no Éden (nome do local onde fica a cabana) não poderia ser mais óbvia. Remete a Adão e Eva no Paraíso. Estes personagens, mais os médicos citados no início da trama, representam as três dimensões humanas: Ele sendo o Espírito, Ela o Corpo e os médicos a Razão. A Razão é logo descartada (“os médicos não sabem nada” diz Ele) e vemos o embate entre o Espírito e o Corpo, entre o transcendente e o corpóreo.
A história começa com a morte do filho, com a perda da inocência e a consequente culpa: a “queda” da criança representa a “queda” do ser humano. A partir daí passam-se três fases. Primeiro a dor da perda (Grief) em movimento contínuo conforme simbolizado pelo veado (que simboliza fecundidade, crescimento, renascimento) e o constante ruído das sementes caindo das árvores no teto da cabana. O aborto do veado demonstra que o nascimento, a criação, já vem com a dor da perda. Depois escala para a dor pura (Pain – chaos reigns) representada pela raposa, simbolizando as contradições humanas que dilaceram o homem e trazem o caos. E desemboca no desespero (Despair) conforme o corvo traz o mau presságio (sentido moderno do corvo). O corvo também era visto na mitologia antiga como mensageiro de Deus ou guia, e o corvo guia a Corpo ao Espírito (toca) e guia o Espírito a sua libertação (cabana ao final). No auge do desespero, perda da esperança atingida com a chegada do corvo (último dos three beggars), há a ruptura, com o espírito sobrepondo-se a matéria. Findo um ciclo que recomeça novamente com o surgimento das mulheres sem face que caminham na direção sua ao final, quando Ele começa novamente a sair do Éden. A dualidade, tensão, entre Espírito e Corpo na terra é insolúvel.
O filme é carregado de símbolos que corroboram com o resumo acima:
A árvore onde eles fazem sexo e cujas raízes aprisionam vários braços seria a Árvore da Vida no momento que Ele sucumbe diante dela e impossibilita a ascensão. Impossibilita a regra geral da existência humana, sair da terra e subir ao céu.
No bosque há a figura da toca (genitália feminina - matéria) e da árvore seca (genitália masculina - espírito). Ao final a toca é destruída e a árvore aparece rodeada de mulheres mortas (aspectos materiais), ciclos passados onde o Espírito derrotou a Matéria. O Espírito, apesar de tudo, sempre prevalece.
A ponte no bosque representa passagem entre mundos, do mundo material ao mundo supra-sensível. Ela (Matéria) teme a ponte, Ela teme o bosque (Éden - Paraíso), o homem teme seu componente diabólico, teme a si mesmo (conforme Ele escreve no triângulo da hierarquia dos medos dela). Num momento Ela diz não ter mais medo do bosque e da ponte. Era mentira. A matéria dissimula, ilude o homem.
A tese dela versava sobre o genocídio das mulheres ao longo da história. Caracterizando seu aspecto diabólico. Os sapatos calçados no filho de forma invertida também mostram o aspecto diabólico, isso ocorre quando o espírito está ausente (Ela reclama da ausência dele naquele período numa conversa anterior). A agressividade sexual dela também realça o aspecto do desejo, neste caso do desejo ilegítimo.
Vasculhando os papéis da tese Ele vê a menção aos three beggars e visualmente há uma referência as estrelas. O inexorável processo de perda, dor e desespero é transcendente ao homem.
Ela teme perdê-lo, o aprisiona (roda na perna) e se desespera com seu desaparecimento. A Matéria não pode viver sem o Espírito. Ela quer mantê-lo preso ao chão, impedir a ascensão do homem.
Ele tem um ataque de ansiedade igual ao que Ela teve no começo do filme, quando Ele explicava que aquilo era físico. Neste ataque (logo depois da sua libertação) Ele a mata. O espírito faz uso da força, empresta elementos físicos, para se impor. Como Zeus que conclama os Gigantes para derrotar os Titãs na Teogonia de Hesíodo, usando a violência contra a violência, sem isso não há como combatê-la.
Ele é castrado como Urano. Gaia (via seu filho) castra Urano. Ao final parece que Ela quer morrer, a Matéria aceita a superioridade do Espírito (e isso ocorre ao longo da história – ver a tese e cena final da árvore seca). Ela entende seus erros e se auto-mutila. Algo inato no homem entende o certo e o errado, o homem erra com consciência. E se animaliza quando perde esta consciência.
Finalmente, o título do filme traz o último “t” de “antichrist” com a cruz ansada que representa a vida, a verdadeira cruz de Cristo para os coptas. E a única música do filme, da ópera Rinaldo de Händel (Lascia ch’io pianga) fica repetindo o refrão: “Deixe-me chorar meu cruel destino. Deixe-me suspirar pela minha liberdade”
Uma visão sombria do mundo que coloca a condição do homem na terra como um castigo. Obra de um anticristo e não de Deus.
Apesar da bela fotografia o filme é muito ruim. Os diálogos são artificiais, a violência é gratuita e a mensagem é pobre.
Filme Nota 1 (escla de 1 a 5)