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Castro de Antônio Ferreira


Personagens Principais Inês de Castro – dama de honra da esposa de D. Pedro D. Pedro – herdeiro do trono de Portugal, amante de Inês D. Afonso III – rei de Portugal, pai de D. Pedro

Personagens Secundárias Pero Coelho – conselheiro do rei Diogo Pacheco – conselheiro do rei Ama – ama de Inês de Castro Coro – moças de Coimbra Secretário – secretário de D. Pedro Mensageiro – anuncia a morte de Inês a D. Pedro

Interpretação A tragédia caracteriza-se por acontecimentos funestos recaírem sobre personagens que nada teriam feito por merecê-lo, ou seja, eventos orquestrados por forças além da ação e, muitas vezes, da compreensão humana. Difere-se assim do drama, este distinguido pela clara interferência humana nos eventos prejudiciais as personagens.

O teatro trágico nasceu na Grécia e foi totalmente substituído pelo drama. Poucos autores escreveram tragédia fora os gregos antigos, destacando-se o teatro clássico francês de Racine e Corneille (século XVII) como a última tentativa de retomar o modelo dramático da antiguidade. Apesar de nomearmos um conjunto de peças de Shakespeare como tragédias, estas são na verdade dramas, com a possível exceção de Romeu e Julieta. Por isso é significativo que em meados do século XVI, o português Antônio Ferreira tenha nos brindado com uma tragédia no melhor estilo grego.

Castro apresenta um confronto do direito à vida e ao amor com a razão e deveres de Estado, incluindo debate sobre o sentido de justiça e acerca do ônus da liderança entre D. Afonso e seus conselheiros. Todos tem certa razão em seus pleitos e ações. Com maestria o autor põe ênfase no conflito interno das personagens, comovendo pela dimensão humana da narrativa.

A balança da nossa empatia ora pende para o casal, apesar do adultério, e ora para o rei, no que pese a solução posta em prática. A personagem menos empática é D. Pedro, pois seu dharma era claramente não repetir o erro de seu pai (D. Afonso repudiou a primeira esposa para casar-se com outra), mas não escapou a seu karma.

O desaparecimento das tragédias conforme entramos na modernidade coincide com a perda do sentido trágico de nossa existência. Vemos tudo pela ótica dramática e buscamos responsáveis pelos nossos problemas e infortúnios, mesmo que eles não existam, gerando conflitos e ressentimentos que esgarçam o tecido social e penalizam nossas vidas.

Tragédias como Castro nos ensinam a sermos menos orgulhosos e aceitarmos a debilidade de nossa condição humana.


 

Notas

  • Antônio Ferreira (1528-1569) nasceu em Lisboa, Portugal.

  • Poeta e dramaturgo. Deu grande impulso ao classicismo introduzido por Sá de Miranda, de quem foi discípulo.

  • A obra poética, incluindo a tragédia Castro, foi publicada em 1598 com o título Poemas Lusitanos.

  • Castro é a mais perfeita tragédia clássica da literatura portuguesa.

  • Inês de Castro tornou-se conhecida ao ter a sua história lembrada por Camões no Canto III de Os Lusíadas, onde faz referência à “mísera e mesquinha, que depois de ser morta foi rainha”.

  • Fatos históricos: Inês de Castro (1320 ou 1325 - 7 de Janeiro de 1355), uma nobre galega, foi amante e talvez esposa do futuro Pedro I de Portugal, tendo sido executada às ordens do pai deste, Afonso IV. Ela chegou a Portugal em 1340, integrada como aia no séquito de Constança Manuel, filha de João Manuel de Castela, um poderoso nobre descendente da Casa real Castelhana, que iria casar com o príncipe Pedro, herdeiro do trono Português. O príncipe apaixonou-se por Inês pouco tempo depois, negligenciando a mulher legítima, Constança, e pondo em perigo as débeis relações com Castela. Tentando separar Pedro e Inês, Constança convida Inês como madrinha do seu primeiro filho varão, o Infante Luís (1343), já que de acordo com os preceitos da Igreja Católica de então, uma relação entre um dos padrinhos e um dos pais do batizando era quase incestuosa. A criança não durou um ano, o que fez aumentar as desconfianças em relação a Inês de Castro. Sendo o romance adúltero vivido às caras, o rei Afonso IV (que havia promulgado leis contra este tipo de situações) manda exilar Inês no castelo de Albuquerque, na fronteira espanhola, em 1344. No entanto, a distância não apagou o amor entre os dois apaixonados e, segundo a lenda, continuavam a corresponder-se com frequência. Em outubro do ano seguinte, Constança morre ao dar à luz o futuro Fernando I de Portugal, deixando Pedro viúvo e um homem livre. Inês volta do exílio e os dois foram viver juntos para longe da corte, tendo tido quatro filhos: Afonso (morto em criança), João, Dinis e Beatriz. Afonso IV tentou por diversas vezes organizar um terceiro casamento para o seu filho, com princesa de sangue real, mas Pedro recusa tomar outra mulher que não Inês. O velho Rei receava a influência da família de Inês, os poderosos Castro, no seu filho e herdeiro; além disso, o único filho varão de Pedro e Constança Manuel, Fernando, era uma criança frágil, e crescia a insegurança em relação à sua vida para que um dos saudáveis filhos de Inês de Castro pudesse ocupar o trono. A nobreza portuguesa também começava a inquietar-se com a crescente influência castelhana sobre o futuro rei. O rei Afonso IV decidiu então que a melhor solução seria eliminar Inês. Depois de alguns anos no Norte, Pedro e Inês haviam regressado a Coimbra e se instalado no Paço de Santa Clara. A 7 de janeiro de 1355, o rei cede às pressões dos seus conselheiros, e aproveitando a ausência de Pedro numa excursão de caça, envia Pêro Coelho, Álvaro Gonçalves e Diogo Lopes Pacheco para executar Inês. Os três dirigiram-se ao Mosteiro de Santa Clara em Coimbra, onde Inês se encontrava e a degolaram-na. Tal facto, segundo a lenda, terá originado a cor avermelhada das águas que correm nesse local da Quinta das Lágrimas. A morte de Inês fez com que Pedro se revoltasse contra Afonso IV, que responsabilizou pela morte e provocou uma sangrenta guerra civil. A Rainha Beatriz interveio e após meses de luta, a paz foi selada em agosto de 1355. Pedro tornou-se o oitavo rei de Portugal em 1357. Em junho de 1360 faz a famosa declaração de Cantanhede, legitimando os filhos ao afirmar que se havia casado secretamente com Inês, em 1354 "em dia que não se lembrava". A palavra do rei e de seu capelão foram a única prova deste casamento. Pedro perseguiu os assassinos de Inês, que tinham fugido para Castela. Pêro Coelho e Álvaro Gonçalves foram apanhados e executados. Diogo Lopes Pacheco conseguiu escapar para França, e foi mais tarde perdoado pelo Rei no seu leito de morte. Pedro mandou construir dois esplêndidos túmulos no mosteiro de Alcobaça, um para si e outro para onde trasladou os restos de sua amada Inês. A tétrica cerimonia do beija mão, tão vívida no imaginário popular, provavelmente foi inserida nas narrativas do final do século XVI, depois de Camões escrever em seu Canto III, a tragédia da Linda Inês. Pedro juntou-se a Inês em 1367, e os restos de ambos jazem juntos até hoje, frente a frente, para que, segundo a lenta "possam olhar-se nos olhos quando despertarem no dia do juízo final".

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